"Um homem é rico em proporção ao número de coisas de que pode prescindir." (Thoreau)
Não gosto muito da expressão "filosofia de vida", talvez por acreditar que ela não faça jus nem à filosofia, nem à vida, ou como se viver seguindo uma (ou crer que se vive de acordo com uma) fosse uma dessas ilusões que usamos para dar significado à existência. Uma bobagem, assim como "ter uma ideologia". Mas encontrei um caso, ou melhor, três, em que a expressão fez sentido pra mim. Na natureza selvagem, o filme. Into the wild, a trilha sonora. Thoreau, a inspiração.
O filme narra a história real de Christopher McCandless, que abandona tudo ao terminar a faculdade, para viver na natureza, seguindo um estilo de vida pouco usual, em nada ditado pelos padrões sociais. No caminho de desprendimento, ele se torna Alexander Supertramp. Dirigido por Sean Penn, o filme é dividido em fases que correspondem à trajetória de iluminação de McCandless/Supertramp. Surpreendente, intrigante, transformador. É praticamente impossível sair ileso ou não ser tocado em pelo menos uma ideia na teia embolorada de nossas mentes. Na natureza selvagem é um desses "filmes de cabeceira" que nos acompanha ao longo da vida, caso a nossa alma não envelheça.
A trilha sonora de Eddie Vedder é igualmente iluminadora. A sonoridade é deliciosa e emoldura a narrativa de modo perfeito. Letras como "Society, you're a crazy breed, hope you're not lonely without me" (Society), "I'll take this soul that's inside me now like a brand new friend I'll forever know" (Long Nights), "On bended knee is no way to be free" (Guaranteed), traduzem em forma de música a filosofia vivida por Christopher. A lista se completa com Setting Forth, No Ceiling, Far Behind, Rise, Tuolumme, Hard Sun, The Wolf e End of the Road. A trilha, mais um caminho de iluminação.
Henry David Thoreau (1817-1862) é um propragador dos ideais anarquistas (nesse sentido, vale a pena ler Desobediência Civil) e precursor da geração beatnik e do movimento hippie, defendendo princípios libertários, o desapego à sociedade e suas normas, e a vida simples na natureza. Absolutamente iluminador. É um dos autores que inspiram McCandless/ Supertramp. Walden, o livro que não o abandona. Na natureza selvagem é uma verdadeira materialização de suas ideias.
"Fui para os bosques porque pretendia viver deliberadamente, defrontar-me apenas com os fatos essenciais da vida, e ver se podia aprender o que tinha a me ensinar, em vez de descobrir à hora da morte que não tinha vivido. Não desejava viver o que não era vida, a vida sendo tão maravilhosa, nem desejava praticar a resignação, a menos que fosse de todo necessária. Queria viver em profundidade e sugar toda a medula da vida, viver tão vigorosa e espartanamente a ponto de pôr em debandada tudo que não fosse vida, deixando o espaço limpo e raso; encurralá-la num beco sem saída, reduzindo-a a seus elementos mais primários, e, se esta se revelasse mesquinha, adentrar-me então em sua total e genuína mesquinhez e proclamá-la ao mundo; e se fosse sublime, sabê-lo por experiência, e ser capaz de explicar tudo isso na próxima digressão." (Walden)
(Dedico essa postagem a três amigos: Vinícius, a primeira pessoa a me falar do filme e leitor antigo de Thoreau; André Rolim, por me lembrar do filme e me indicar outros também; e Igor, por ter me emprestado o filme e dividir comigo o interesse por essa "filosofia".)
5 comentários:
Ótima postagem,bom filme também aprecio! TchAU!
Eu também falei desse filme, desse livro, dessa coisa de viver por um ideal, de ter uma filosofia de vida e princípios morais tão fortes que pode escolher isolar-se no meio de uma floresta ou até matar-se por uma idéia.
Belíssima postagem, Rose. Beijo!
i am suuuuuuperrtrammmmmmmmp! \o/\o/
adorei o post rose mariaa. =]
leve a vida simplesmente.
a joaninha te mandou um bjo. ahueaheua
Esse filme é ótimo! ele mostra que ainda existem pessoas dispostas a não concordar com tudo isso posto...bjo!
Esse filme e a trilha sonora mexeram muito comigo também.
Obrigado pela dedicatória! Adoro seu blog e admiro seu talento para escrever. E o mais legal é que conhecendo você pessoalmente sei que só é possível escrever dessa maneira por causa de quem você é.
Lembro-me de Mário Quintana:
“Jamais deves buscar a coisa em si, a qual depende tão-somente de espelhos.
A coisa em si, nunca: a coisa em ti.
Um pintor, por exemplo, não pinta uma árvore: ele pinta-se árvore.
E um grande poeta – espécie de rei Midas à sua maneira – um grande poeta, bem que ele poderia dizer:
- Tudo o que eu toco se transforma em mim.” (Quintana, 1998)
Vejo isso no que você escreve, nos grandes atletas, poetas, músicos e outros artistas. Enfim, nas grandes pessoas!
Beijo
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