sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Nós, andarilhos, somos todos feitos assim. Nossa ânsia de peregrinar, de vagabundear se constitui na maior parte de amor e erotismo. A metade desse romantismo não é nada mais do que a esperança por uma aventura. A outra metade, porém, é um instinto inconsciente em transformar e aniquilar o erótico. Nós, os peregrinos, já estamos acostumados em acalentar amores impossíveis por serem impossíveis, e aquele amor que deveria pertencer a uma mulher facilmente dividimos entre a aldeia e a montanha, o lago e o precipício, as crianças pelo caminho, o mendigo na ponte, o gado no pasto, o pássaro e a borboleta. Nós separamos o amor da matéria amada, o amor em si nos satisfaz da mesma forma como não buscamos no caminhar a meta, senão só o próprio prazer do caminhar, de estar a caminho.
Jovem dama com o rosto cheio de frescor, eu não quero saber teu nome, não penso em alimentar nem acalentar meu amor por ti, pois não és a meta do meu amor, senão seu impulso. Darei esse amor de presente às flores do caminho, ao reflexo do sol no copo de vinho, à redonda e vermelha torre da igreja. És tu que fazes com que me apaixone pelo mundo.

(Caminhada, Herman Hesse)

Um comentário:

Ana disse...

Muito interessante! Vai de encontro a alguns pensamentos meus!